Fichamento de artigo de Philippe Layrargues: Muito além da Natureza

Antes de mais nada, veja o post Fichamentos de artigos e livros de educação ambiental, com as “regras de uso”.

 

LAYRARGUES, Philippe Pomier. Muito além da natureza: educação ambiental e reprodução social. In LOUREIRO, C.F.B.; LAYRARGUES, P.P.; CASTRO, R.S.de (orgs.). Pensamento complexo, dialética e educação ambiental. São Paulo: Cortez, 2006 (pp71-103).

 

“O ecologismo radical ou fundamentalista, que iniciou o caminho da crítica à sociedade moderna, deixou-nos como herança uma de suas principais mensagens, que era a defesa incondicional à imunidade com relação às doutrinas ideológicas clássicas; ele não estaria nem à esquerda nem à direita, mas imperando triunfalmente adiante do capitalismo ou socialismo” (Layrargues, 2006: 73).

“não se trata apenas de estabelecer uma nova relação entre os humanos e a natureza, mas dos humanos entre si, e destes com a natureza” (Layrargues, 2006: 73).

“para pragmaticamente se prosseguir criando novas mercadorias a partir da tecnologização da crise ambiental, e se prosseguir na farra do lucro na contínua conversão / reconversão da degradação / conservação ambiental” (Layrargues, 2006: 74).

“porque trilhar o rumo do “desenvolvimento sustentável”, incorporar os sistemas de gestão ambiental nas empresas, ou adotar um comportamentl individual ‘ecologicamente correto’ não significa estar imune às clássicas doutrinas político-ideológicas, e tampouco estar afastado das relações sociais cotidianas” (Layrargues, 2006: 74).

“Um cidadão ‘ecologicamente correto’, preocupado com a construção da sustentabilidade planetária, pode ser um cidadão que adote comportamentos que favorecem o capital ou o trabalho, o mercado ou a sociedade, as forças sociais progressistas ou conservadoras, as elites ou os grupos sociais vulneráveis, os princípios liberais ou o ideal da justiça distributiva” (Layrargues, 2006: 74).

“A ecologia poderá sim ser uma nova e utópica doutrina ideológica, mas nunca deixará de ser política. A educação ambiental tampouco” (Layrargues, 2006: 74).

“As sociedades não são estáticas, perenes, imutáveis. Elas se modificam ao longo do tempo” (Layrargues, 2006: 75).

“O estudo sociológico consiste então em analisar as forças e os processos responsáveis por tais mudanças (…). A grosso modo, as duas correntes teóricas de maior expressão, e que rivalizam concepções e olhares bastante diferenciados entre si sobre a ‘mudança social’ são o Funcionalismo e a Teoria crítica” (Layrargues, 2006: 75).

“O Funcionalismo concebe a sociedade como uma grande entidade orgânica, à semelhança de um organismo biológico; e como tal, internamente harmonioso. (…) Para o funcionalismo o que ocorre é a existência esporádica de alguns ‘defeitos’ na sociedade, como a criminalidade por exemplo, que precisam ser ‘corrigidos’” (Layrargues, 2006: 75-76).

“Por outro lado (…) a Teoria Crítica, com a sociologia do conflito, afirma que a sociedade não é uma entidade orgÂnica, ao contrário, é informada por múltiplos interesses conflituosos, contraditórios que estão permanentemente em disputa, demarcando embates de toda natureza” (Layrargues, 2006: 76).

“a visão funcionalista sobre a educação concebe seu papel como sendo um instrumento encarregado da transmissão de valores culturais de geração em geração (…). A Educação é concebida como um instrumento de reprodução das condições sociais (…)” (Layrargues, 2006: 76).

“Porém, para a Teoria Crítica, a Educação é um dos espaços – políticos – onde se travam as disputas ideológicas entre os grupos antagônicos (…). Para a Teoria Crítica a Educação é mais um campo de disputa que cumpre um papel de desalienação ideológica das condições sociais, evidenciando que as coisas nem sempre foram assim, e que não têm porque continuarem assim sendo” (Layrargues, 2006: 76–77).

“Nesse contexto, a educação ambiental, enquanto educação, em tese é uma modalidade de ensino que necessariamente se vincula à dupla função da educação:”

· A função moral de socialização humana.

· A função ideológica de reprodução das condições sociais (que contempla a possibilidade tanto de manutenção como transformação social)” (Layrargues, 2006: 77).

“Mas como a educação ambiental surge em decorrência de uma crise ambiental, aquela clássica função moral de socialização que antes se restringia ao ser humano, se atualiza e aparece agora ampliada à natureza, seu foco de atenção privilegiado” (Layrargues, 2006: 77).

“Entende-se que as raízes da crise [ambiental] estão assentadas no paulatino processo histórico de afastamento do ser humano perante a natureza, efetuado desde a instauração do monoteísmo e do Iluminismo, resultando no atual paradigma antropocêntrico utilitarista” (Layrargues, 2006: 77).

“Uma das questões centrais do debate no campo da educação ambiental, gira em torno da ampliação da esfera da ética, agora também ecológica, através da promoção de uma volumosa mudança cultural por intermédio da educação” (Layrargues, 2006: 78).

“Essa subtração da função político-ideológica de reprodução das condições sociais dentro da educação ambiental, à semelhança da subtração da vertente da ecologia política na comunidade ambientalista, provavelmente teve sua influência determinada pela Ecologia Profunda e pelo ambientalismo pós-materialista, que concebem a crise ambiental como uma crise de valores civilizatórios, pois seriam os paradigmas culturais e a visão de mundo moderna, os elementos fundantes da ruptura na relação humana com a natureza” (Layrargues, 2006: 78).

“cristaliza-se (…) uma concepção de educação ambiental que tornou-se hegemônica, que tem como tarefa prioritária a promoção de uma mudança cultural como a contribuição da educação para a reversão da crise ambiental” (Layrargues, 2006: 78).

“Assim, a educação, em tempos de crise ambiental, tem-se revestido majoritariamente da função moral de socialização humana ampliada à natureza, rumo à construção da ética ecológica no terreno da cultura” (Layrargues, 2006: 79).

“a abordagem sociológica da crise ambiental permite a visualização de um outro [além da cultura] elemento mediador dessa relação [humana com a natureza], muito menos evidente nesse fazer educativo: é o trabalho, juntamente com a cultura, que compõe o diálogo entre o plano material simbólico quanto aos determinantes da crise ambiental. (…) [o que] possibilita que esse fazer educativo integre a base material da crise ambiental, pois é nela que se assenta a produção de riquezas e sua respectiva distribuição no tecido social, ou pelo contrário, sua concentração nas mãos de poucos” (Layrargues, 2006: 79).

“Sob o manto da generalização discursiva manifestada através de expressões como o ‘impacto antrópico’, a ‘agressão humana’, a ‘sociedade contra a natureza’, dilui-se os agentes sociais que, com suas respectivas responsabilidades diferenciadas, ficam não em segundo plano, mas literalmente ocultos” (Layrargues, 2006: 80).

“os ‘humanos’ não são seres vivos genéricos e abstratos para serem qualificados linearmente numa relação ‘humano-natureza’ como é tão freqüentemente posta, mas sim preenchidos de valores, interesses, intencionalidades e intervenções físicas no mundo bastante diferenciadas” (Layrargues, 2006: 80).

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Declev Dib-Ferreira

Declev Reynier Dib-Ferreira sou eu, professor, biólogo, educador ambiental, especialista em EA pela UERJ, mestre em Ciência Ambiental pela UFF, doutorando em Meio Ambiente pela UERJ. Atuo como professor na rede municipal de educação do Rio de Janeiro e também na Fundação Municipal de Educação de Niterói (FME), no Núcleo de Educação Ambiental (NEA). Sou coordenador de educação da OSCIP Instituto Baía de Guanabara (IBG) e membro/facilitador da Rede de Educação Ambiental do Rio de Janeiro (REARJ)... ufa! Fiz este blog para divulgar minhas idéias, e achei que seria um bom espaço para aqueles que quisessem fazer o mesmo, dentro das temáticas educação, educação ambiental e meio ambiente. Fiz outro blog, com textos literários (http://hebdomadario.com), no qual abro o mesmo espaço. Divirtam-se.

3 thoughts on “Fichamento de artigo de Philippe Layrargues: Muito além da Natureza

  • 26/10/2008 em 01:24
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    Posso ter a ousadia de fazer um comentário?… Eu não aceito de modo algum essa dicotomia entre “humanidade” e “natureza”. O ser humano, queira ou não, é parte dessa natureza. E a natureza (ao contrário do mercado de capitais…) é auto-regulatória e obedece, inflexivelmente, à Lei de Seleção. Os efeitos dos excessos da ação humana vão se fazer sentir em breve. Não vai ser algo “bonito”, mas vai assegurar que os sobreviventes serão mais cuidadosos. Não é uma questão de pessimismo ou rabugice: é apenas uma triste constatação.

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  • 26/10/2008 em 02:41
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    Oras joão! Que ousadia? Você é o comentarista oficial do blog!

    Quanto ao comentário, sim, nós (algumas correntes atuais de EA) também pensamos assim – o ser humano parte integrante da natureza.

    O problema é que muitas das vertentes ambientalistas e de educaçao ambiental não conseguem enxergar isso.

    É difícil romper de uma hora pra outra 200-300 anos de idéia fixa. E foi nessa “separação” que tudo começou.

    Os efeitos já são sentidos – e não só ambiental strictusensamente falando, mas culturalmente, socialmente, urbanamente…

    Vamos ver no que vai dar…

    Abraços.

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  • 28/04/2010 em 21:39
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    Dentro da Educação Ambiental o que me chama a atenção é o conceito “desenvolvimento sustentável” inversamente proporcional ao desenvolvimento do meio ambiente.

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