Até que ponto uma Cultura deve ser respeitada? O caso da índia ianomâmi.

Não estou aqui para definir ou discutir o conceito de Cultura. Quem quiser, faça uma busca.

Mas as culturas não devem ser intocadas simplesmente por sê-las Cultura.

Há determinados atos, atividades, ritos ou seja lá como for que se chame, que devem ser eliminados.

Mesmo que sejam culturais.

Ou abriremos brechas para atos de barbárie se tornarem atos “culturais”.

Em alguns povos é “cultural” castrar as meninas assim que nascem (Veja mais).

mutilacao_feminina

Em outros, uma multidão perseguir um boi atormentando-o, colocando fogo em seus chifres, torturando-o até a morte é considerado uma “festa cultural”.

Farra do boi

Noutros, é cultural a mulher ter pé pequeno, mesmo que às custas de deformá-lo.

Pé pequeno

Noutros ainda, é da cultura matar as primogênitas do sexo feminino, assim como matar os filhos que têm alguma deformidade.

Em todos estes casos e muitos outros, a cultura serve de pano de fundo para atos desumanos.

Mesmo que seja cultural simplesmente o fato de fazer xixi na rua, não é agradável passar com usa esposa, mãe ou namorada ao lado de um grandalhão de pinto de fora molhando o muro.

Faço esta introdução para tecer um comentário rápido sobre o caso da índia ianomâmi deficiente.

Diz a notícia que “a Fundação Nacional do Índio (Funai) ameaça recorrer da decisão para garantir os direitos dos pais da menina”. Segundo o administrador regional da Funai em Manaus, Edgar Fernandes, o desejo dos pais da menina de levá-la para sua aldeia é legítimo e amparado pela Constituição Federal.

Para ele “Os povos indígenas têm direito às suas próprias crenças. Os pais da menina não acreditam mais na medicina ocidental e querem que ela tenha os seus últimos dias na aldeia”.

A própria Funai admite que a retirada da índia do hospital equivale à sua morte:

Sobre o possível ‘sacrifício’ da índia, a Funai divulgou uma nota explicando que esse tipo de ritual faz parte da cultura da etnia ianomâmi. “Gerar um filho defeituoso, que não terá serventia numa aldeia que precisa necessariamente de gente sadia (…) é um grave ‘pecado’, pois este não poderá cumprir o seu destino ancestral”, diz a nota.

Segundo o antropólogo Ademir Ramos,

“O não índio não está discutindo hoje a eutanásia? Essa é uma questão já resolvida para os ianomâmis. Eles precisam de gente saudável na aldeia. Uma criança com deficiência gera uma série de transtornos aos integrantes da tribo”

Ora ora… simples assim? O índio tem esta cultura e por isso deixaremos que mate a criança?

Mas, caras pálidas, a cultura do índio JÁ ESTÁ misturada com a nossa e não é puro sangue desde há 500 anos!

Toda a sociedade tem o dever de zelar pela vida de quem quer que seja. O Estado tem este dever, inslcusive com os índios. Ou então os largue por lá mesmo à sua própria sorte!

O que não vale são as regras mudarem de acordo com os interesses – e eu não sei o interesse da Funai que esta índia seja sacrificada, pois sabemos que será.

Afinal, eu nunca soube que utilizar roupas de “não índio” fazia parte da cultura deles.

Nunca soube que faz parte da cultura indígena assistir televisão.

Nunca soube que ter carro e até mesmo avião fazia parte da cultura deles.

A mistura é fato.

O respeito à cultura tem limites.

Ou a Funai acha que, se por acaso tivéssemos antropófagos no Brasil, eles deveriam continuar com a sua “cultura”???

 

Abraços,

Declev Reynier Dib-Ferreira

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Prticipe do Movimento:

SE EU FOSSE SECRETÁRIO(A) DE EDUCAÇÃO, O QUE EU FARIA?

Declev Dib-Ferreira

Declev Reynier Dib-Ferreira sou eu, professor, biólogo, educador ambiental, especialista em EA pela UERJ, mestre em Ciência Ambiental pela UFF, doutorando em Meio Ambiente pela UERJ. Atuo como professor na rede municipal de educação do Rio de Janeiro e também na Fundação Municipal de Educação de Niterói (FME), no Núcleo de Educação Ambiental (NEA). Sou coordenador de educação da OSCIP Instituto Baía de Guanabara (IBG) e membro/facilitador da Rede de Educação Ambiental do Rio de Janeiro (REARJ)... ufa! Fiz este blog para divulgar minhas idéias, e achei que seria um bom espaço para aqueles que quisessem fazer o mesmo, dentro das temáticas educação, educação ambiental e meio ambiente. Fiz outro blog, com textos literários (http://hebdomadario.com), no qual abro o mesmo espaço. Divirtam-se.

10 thoughts on “Até que ponto uma Cultura deve ser respeitada? O caso da índia ianomâmi.

  • 21/04/2009 em 21:14
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    É necessário um reparo, Declev… Os Yanomami não são “aculturados”: continuam na idade da pedra e a “eugenia radical” faz parte da cultura deles. Eu não entendo porque a nossa cultura tem que ser considerada “superior” à deles…
    Essa indiazinha não tem lugar na cultura yanomami. Parece desumano?… Basta lembrar que na “nossa” cultura o respeito pela vida está mais no discurso do que na prática. Pela “ética yanomami”, ela deve ser morta para não ser um peso para a tribo. E como nós “civilizados” tratamos nossos deficientes?… Não os matamos, mas quase nunca nos lembramos de que eles estão vivos… Aliás, nem precisa ser deficiente: basta ser canhoto e o mundo fica “esquerdo” com você.
    Se nossa sociedade acha que pode arcar com a sobrevida dessa ex-indiazinha (porque, em tanto quanto índia, ela já morreu), que a acolha, cuide e, se for o caso, volte mais tarde e a exiba para os Yanomami. Quem sabe eles não repensam, então, seu sistema ético?…

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    • 21/04/2009 em 22:08
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      Pode ser essa a solução, João.

      Mas entregá-la a morte, sinceramente, não sei.

      Como eu disse, agiríamos como “normal” na cultura deles se fossem antropófagos?

      Do tipo “comeu o pesquisador porque é da cultura deles”?; “Matou a família em viagem porque invadiram o território e fizeram um banquete porque é da cultura deles”?

      Eu não acho que nossa cultura seja superior. Tanto que dei o exemplo da farra do boi, do xixi nas ruas… e há muitos outros.

      Claro que a forma de tratar os deficientes “por aqui” ainda está longe de ser a ideal. Mas não podemos negar avanços. Chegaremos um dia ao ideal.

      De qualquer forma, o que quis dizer com o artigo é que em qualquer cultura, o respeito à vida, de quem quer que seja, humano ou não, é o que é de superior.

      Nem sempre damos exemplos disso. Mas o que tem de distorcido na nossa tem que ser revisto e mudado.

      Idem a qualquer uma.

      As culturas não são estanques. Muito pelo contrário, são mutantes.

      Abraços.

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  • 21/04/2009 em 22:41
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    Pois é… Eu só posso responder com um “sei lá!…”

    Já que nos incomoda a solução yanomami, cabe a nós solucionar de maneira diferente. Mas não adianta tentar impor nossos padrões culturais sobre eles: esse povo, literalmente, ainda está na Idade da Pedra Lascada. Dentro do “universo cognitivo” deles, nossa insistência em manter a indiazinha viva é “indecente”.

    Agora, a posição da FUNAI é de um ridículo a toda prova. A FUNAI é um orgão do governo brasileiro, não do que passa por “governo” na tribo Yanomami. Nós sabemos que a indiazinha não tem</b. que morrer. Cabe ao governo fazer por ela o que devia fazer por todos os órfãos e desvalidos: tomá-la sob sua tutela.

    Se era para deixá-la morrer, deviam tê-la deixado na aldeia…

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  • 22/04/2009 em 17:06
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    João Carlos,
    Concordo com você. Mas, posso compreender a indignação do Declev perante o assunto.
    Quando uma questão dessa magnitude vem a público, ela passa a nos pertencer também.
    Abraços e, feliz Dia da Terra!

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  • 05/05/2009 em 13:03
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    Declev , olá !
    Costume é costume , e tem que ser respeitado !
    O ato de “castrar(?) as meninas assim que nascem” é semelhante com o que ocorre com os meninos Judeus ( costume de um povo que se considera o mais inteligente na Terra ! ) . No fundo este ato é para não despertar precocemente o desejo sexual já que são retiradas as suas partes mais erógenas ! Talvez esta necessidade tenha surgido na formação destes povos para evitar que na imaturidade ocorresse a geração de uma nova vida em alguém que ainda está na dependência de cuidados por parte dos poucos membros ocupados , então , em sobreviver !
    Caro Declev , os indígenas que ainda são autênticos ( que tiveram a sorte de não ter sido acessados por nossa “civilização” ) é o povo que está mais próximo de Deus , pois eles são regidos pela Natureza !
    Com certeza , é o povo que consegue sentir a verdadeira Paz e ter felicidade ! Por ter seus próprios costumes é que eles não possuem o sentimento da ganância !
    Na Natureza só sobrevivem os mais fortes , mais cedo ou mais tarde , irá servir à cadeia alimentar , por este motivo , uma cadela após ter retirado e comido a placenta dos até dez primeiros filhotes , ou ela deixa os seguintes morrerem dentro de suas placentas ,ou ela simplesmente os come ! E por que disto ? É a Lei da Evolução : os primeiro filhotes que nascem , são os mais fortes e saudáveis e os últimos , o inverso . Caso todos viessem a serem alimentados pela mesma cadela , a saúde de todo a prole ficaria comprometida !
    Em relação à Natureza e ao sacrifício de filhotes , sei que é costume em algumas tribos ( se ainda existirem estas tribos ) , a índia que comete adultério é posta em reclusão até que nasça o seu feto e , então , perante toda a tribo reunida , ela presencia o seu feto ser enterrado vivo e , ato contínuo , ela é banida da tribo ! Aí vocês irão afirmar que isto esta errado …Eu digo que é o costume daquela tribo e , por ser tão anti-natural , serve como exemplo ao comportamento das índias que assistiram e , mais importante , das índias das próximas gerações , pois esta “cerimonia” fica historicamente na memória da tribo !
    Outro exemplo da “crueldade” indígena é o costume de comerem solenemente o grande guerreiro por eles abatido em guerra . Ocorre que para estes indígenas , ao se alimentar do bravo guerreiro abatido , eles adquirem um pouco daquela bravura ! É , em si , até um ato de glorificação daquele que soube ser guerreiro na batalha vencida …Já o Diogo Álvares Correia escapou de ser devorado pelos Pataxós , em 1510 , na atual Bahia , pois momentos antes do ataque , eles presenciaram o “Trovão” cuspido da espingarda do Caramuru casando um pássaro , sorte dele !
    Finalizo afirmando que os Yanomamis nunca matariam uma das suas crianças , pois eles ( como todas as tribos indígenas ) tem respeito à vida . O que pode ocorrer é que a pajelança pode as vezes falhar …
    Os indígenas respeitam tanto a vida que todos os seus idosos ficam sendo mantidos por toda a tribo ( mesmo “selvagens na idade da pedra lascada” ) os indígenas brasileiros já possuíam o seu sistema de aposentadoria ! Quando um índio adoece , a tribo cuida dele e de seus dependentes ! É , ou não é , um sistema de previdência social avançado ?
    Abraços á todos !
    Somel Serip .
    somelserip@gmail.com

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    • 06/05/2009 em 17:57
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      Oi Somel,

      As culturas indígenas tem muitas coisas interessantes e, irônico, muitas delas mais “avançadas” que as nossas.

      Só que Direitos Humanos são universais. Isso pra mim não tem discussão.

      Castrar as mulheres é absolutamente diferente da circuncisão dos judeus. A castração das mulheres retira delas o órgão sensitivo, justamente para que “elas” não possam sentir prazer. É mutilação.

      No caso dos meninos judeus retira-se o excesso de pele em torno da glande. Isso é até higiênico. Tenho amigos que fizeram depois de adultos, e apesar do desconforto, recomendam.

      E no caso da índia que comete o adultério, mas uma vez os costumes e a cultura voltam-se contra “elas”. Acontece o mesmo com os índios que cometem adultério?

      Os “pés pequenos”, são as mulheres. Os homens se mutilam daquele jeito?

      E, defendendo costumes como esses, resistem pelo mundo, por exemplo, o apedrejamento das mulheres adúlteras em praça pública (mais uma vez, contra “elas”), dentre outros exemplos, alguns dos quais já citei no artigo.

      E o infanticídio, contra as crianças. Em muitos casos, contra As primogênitAs (olha elas aí de novo!).

      É claro que podem ser costumes centenários ou até mesmo milenares, mas, para mim, também é claro que devem acabar.

      Mais do que costumes, muitos deles são opressões às mulheres (ou às crianças, ou aos animais…).

      Independente de ser entre indígenas, judeus, árabes, “ocidentais”, brasileiros…

      Direitos humanos são universais.

      Abraços.

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  • 22/05/2009 em 10:58
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    Nossa Declev, eu já ia ser indelicada com o sr. Somel sobre o fato da cultura não afetar pessoas do sexo dele, mas você me salvou de ser rude! Totalmente de acordo com as suas palavras!

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  • 11/04/2010 em 15:58
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    Acabamos com os índios,com nós mesmos,com o meio ambiente,com tudo que podemos achar que pensamos de forma correta em relação as outras culturas.Se é para para respeitar um cultura,deixando-a sobreviver com seus atos e costumes,não pode haver meio termo.Ou se respeita a cultura e se entende que ela é diferente de nós.Ou acaba com ela.Querer que esses indígenas vivam pensando igual a nossa cultura,é simplesmente querer que eles acabem com o modo de vida deles e assumam o nosso.Hoje concordo que a índia não seja morta.Mas só porque meia dúzia de desavisados se meteram onde não é chamado.Somos uma sociedade hipócrita,cheia de mazelas da piores que podem existir,incompetentes para resolvê-las,e, que não somos exemplo para cultura de ninguém.Os silvícolas brasileiros tem sua história.Algumas pessoas se chocaram com o caso agora,mas,o hábito indígena é esse.Vai condená-los a prisão perpétua pelas outras crianças,que de forma milenar tiveram o mesmo destino?pois pelo jeito só é o que falta a alguns falsos respeitadores da cultura alheia fazer.

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  • 20/04/2010 em 10:10
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    Declev Dib-Ferreira e Michelle, olá !

    Para todos os efeitos, não sou do tipo que diz: ” brasileiros e brasileiras “, pois sei que o múltiplo sujeito possui o gênero masculino !

    Ao comparar com a circuncisão, que tradicionalmente é feita ao nascer, não me referi ao aspécto do tráuma psicológico, já que no caso as MENINAS são “castradas” NO INÍCIO DA PUBERDADE !

    Eu comparei pelo fato de que este COSTUME CULTURAL possa estar relacionado à intenção de ” não despertar, precocemente, o desejo sexual já que são retiradas as suas partes mais erógenas !
    Talvez esta necessidade tenha surgido na formação destes povos para evitar que na imaturidade ocorresse a geração de uma nova vida em alguém que ainda está na dependência de cuidados por parte dos poucos membros ocupados , então , em sobreviver !”
    .
    Declev, ao meu ver, ambas intervenções – excisão, nas meninas, e circuncisão, nos meninos – são MUTILAÇÕES ” idealizadas” para reduzir a sensibilidade sexual !
    QUERO que fique bem esclarecido : NÃO SOU FAVORÁVEL À AMBAS MUTILAÇÕES . Só as comparei pois fazem parte da “cultura” de alguns povos e, como não faço parte deles, eu não vou querer que eles sigam o que eu penso à este respeito .

    Ainda para esclarecer, Michelle, que não enfoquei AS MULHERES , pois a Cultura de um Povo pode também afetar OS HOMENS !

    Na sequência, alguns aspéctos culturais, copiados em http://www.arara.fr/BBTRIBOS.html, para diversificar o assunto : Respeitar o costume cultural alheio .

    Os KARAJÁ preferem a monogamia e o divórcio é censurado pelo grupo. Se a infidelidade do homem casado se torna pública, os parentes masculinos da mulher abandonada batem no homem infrator perante toda a aldeia, numa grande ação dramática, que pode tomar proporções maiores com o acirramento de ânimos entre os grupos domésticos envolvidos, resultando inclusive em queima da casa da família do marido infrator.

    Em relação aos KULINA, quando se casa, o homem vive na casa da família da esposa e tem que trabalhar para retribuir a mulher. Cada casal tem a obrigação de gerar pelo menos três filhos, ganhando o direito de construir uma casa separada e continuando juntos se desejar. Eles acreditam que a concepção acontece sem qualquer contribuição feminina, e para engravidar, a mulher tanto pode relacionar-se apenas com o marido ou ter vários parceiros. Em qualquer dos casos, ela é a única responsável pelos cuidados com a criança.

    As mulheres dessa tribo Araras usam, como roupa, apenas uma espécie de cinto chamado uluri, feito de entrecasca de árvore. Se esse cinto se romper (por acaso), a mulher se sente desprotegida e nua. A presença deste cinto significa que a mulher não está sexualmente disponível, e a aproximação só acontece quando ela o retira.

    Os Homens da tribo AIMORÉ, adquiriram o hábito de usar discos de madeira no lábio inferior e nos lóbulos das orelhas para expandi-los de forma peculiar.

    Abraços à todos ( Homens ou Mulheres ) !
    Somel Serip.

    Resposta

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