Que as avaliações da educação são importantes, concordamos… mas como fazê-las?

Gosto de pegar alguns comentários instigantes e transformá-los em novos artigos com as respostas.

Me reservo no direito de fazer isso, pois os comentários aqui são públicos, abertos. Só quando me mandam diretamente para o email, no “fale conosco”, eu antes solicito autorização.

Alguns comentários trazem questionamentos interessantes, tal como este abaixo, deixado pelo colega Vinicius, no artigo A Vanguarda do Atraso [Comentário n.5]:

Declev, entendo muito pouco sobre educação. Mas tenho uma dúvida: o sistema educacional precisa ser avaliado de alguma forma, certo? Para saber onde direcionar os investimentos, quais são os melhores modelos e etc. Os quesitos de avaliação devem ser objetivos, permitindo comparar realidades diferentes e etc (até porque, lá na frente, independente de onde aquele aluno tiver vindo, ele vai ter que competir de igual pra igual com o resto, pra entrar na faculdade, pra conseguir emprego e etc). Como seria uma avaliação objetiva e razoavelmente simples para o sistema educacional? Deve ser simples, porque não adianta gerar 30 páginas por escola, com dados subjetivos, difíceis de analisar e comparar. Sempre acreditei nas provas padronizadas. Se elas não dão certo, o que podemos colocar no lugar?

Já respondi nos comentários, mas gostaria de ampliar o debate.

Sei que os alunos terão que competir, mas essa competição nunca é justa. É só ver, em geral, quem são os médicos, os advogados, os engenheiros… e quem são os pedreiros, os garis, os camelôs e os traficantezinhos que morrem ou são presos sem nenhum direito.

Então, tem algo errado, certo?

Mas isso independe de um sistema “objetivo” de avaliação.

Essas provas padronizadas são feitas para se avaliar “tudo e todos” de uma só vez.

Facilita, mas não são justas.

Um aspecto que não é levado em consideração é que, se os alunos têm grandes dificuldades, o trabalho do professor torna-se muito “verticalizado”, quer dizer, tem que trabalhar durante muito tempo um mesmo aspecto, para que os alunos aprendam, no mínimo, o mínimo.

Desta forma, muitas vezes não dá tempo de trabalhar todo o conteúdo de uma determinada matéria no mesmo tempo que daria para trabalhar em uma turma em que os alunos não têm tanta dificuldade.

Em uma avaliação objetiva, eles não querem saber se você teve tempo de trabalhar aquele conteúdo: se teoricamente o conteúdo “deveria” ter sido trabalhado – como foi numa escola particular, por exemplo – ele vai ser cobrado e as notas das crianças… já viu, né?

Ora, em todos os compêndios modernos de educação, diz-se que devemos conhecer a realidade dos alunos, trabalhar com esta realidade, desenvolver trabalhos que façam sentido…

Como pensar que todos podem fazer a mesma coisa, pensar a mesma coisa, aprender a mesma coisa?

No mais, os resultados nunca serão os mesmos, porque as realidades não são as mesmas.

As crianças não têm as mesmas realidades familiares, de habitação, de saúde, de infância (trabalho versus brincadeiras); de segurança versus violência onde moram e por aí vai.

Desta forma, fazer uma avaliação única e “objetiva” é extremamente injusto.

Especialmente porque são justamente as crianças que têm maiores necessidades (por conta da realidade social, realidade familiar, realidade financeira, etc.) que têm as piores escolas!

São eles que precisariam de melhores escolas em termos de tempo, espaço, estrutura, materiais, etc. Mas não têm.

Então, como podemos avaliar as escolas?

Acho que uma boa avaliação das escolas passaria por visitas constantes a elas; entrevistas com alunos, responsáveis, funcionários; conversas com os professores; levantamento do perfil da comunidade; do perfil sócio-cultural dos alunos; conhecimento das famílias; comparação dos resultados deles e do que vêm alcançando, e por aí vai.

Muitas vezes um aluno não consegue alcançar um determinado nível na matemática ou no português, mas por intervenção dos professores, da escola ou mesmo de um professor em especial, ele deixa de se matar, não sai da escola e não fica vagando pelas ruas, não entra no tráfico, não fica grávida, deixa de usar drogas…

Ou, até mesmo, melhora, dentro dos limites dele, em português e matemática!

Isso não é visto, nem como uma sobra, nessas avaliações.

Isso quer dizer que aquele aluno pode nunca alcançar o rendimento de alunos que moram no Alto Leblon, mas que ele mudou muito – e salvou a vida – por intervenção da escola.

As avaliações da educação têm que ser SUBJETIVAS – mesmo que a parte objetiva continue.

No mais, melhores escolas para aqueles que têm maiores dificuldades, na direção de diminuir as diferenças.

Essas avaliações atuais só fazem aumentar as diferenças.

Abraços,

Declev Reynier Dib-Ferreira
Avaliado constantemente pelos próprios alunos

Declev Dib-Ferreira

Declev Reynier Dib-Ferreira sou eu, professor, biólogo, educador ambiental, especialista em EA pela UERJ, mestre em Ciência Ambiental pela UFF, doutorando em Meio Ambiente pela UERJ. Atuo como professor na rede municipal de educação do Rio de Janeiro e também na Fundação Municipal de Educação de Niterói (FME), no Núcleo de Educação Ambiental (NEA). Sou coordenador de educação da OSCIP Instituto Baía de Guanabara (IBG) e membro/facilitador da Rede de Educação Ambiental do Rio de Janeiro (REARJ)... ufa! Fiz este blog para divulgar minhas idéias, e achei que seria um bom espaço para aqueles que quisessem fazer o mesmo, dentro das temáticas educação, educação ambiental e meio ambiente. Fiz outro blog, com textos literários (http://hebdomadario.com), no qual abro o mesmo espaço. Divirtam-se.

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