Professores da escola, ou “aulistas”? Reflexões…

Professores da escola, ou “aulistas”? Reflexões…

É cada vez mais premente entre os professores, cada vez mais presente nas rodas de conversa que o professor tem que se de uma só escola, que o professor tem que ser “40 horas”.

Claro que com um salário decente e compatível com suas formações e funções.

Hoje, em diversas prefeituras, um professor de ensino fundamental é contratado por “16 horas”, ou um pouco mais, dependendo do caso.

Nas minhas duas matrículas sou contratado por 16 horas/aula cada. Dessas 16 horas/aula, temos 12 dentro de sala de aula.

Então, um professor tem que ir pra uma escola, “dar as aulas” e sair correndo pra outra escola.  Às vezes uma de manhã, outra de tarde, outra à noite, quando tem mais de dois empregos. Normal.

Outras vezes, só um turno de trabalho no dia, mas como só é concursado para “dar aquelas aulas”, vai à escola e volta pra casa ou vai fazer outra coisa que nenhuma relação tem com a escola, pois não é contratado para isso. Para mim, um desperdício de tempo e talento.

Afinal, o que pagam em uma matrícula (em apenas um dos empregos) não dá pra viver decentemente como classe média, então tem que ter outro gerador de renda que não aquela escola – pode ser outra escola ou pode ser outra atividade.

E onde fica o planejamento das aulas? Onde fica a preparação das aulas? Onde fica a conversa com os colegas? Onde fica o planejamento e aplicação de projetos, de novas ideias? Onde fica o atendimento mais personalizado com os alunos? Onde fica o atendimento às famílias? Onde fica a pesquisa para melhorar a prática? O estudo? A formação continuada?

Não ficam, pois quem faz as leis não foi bem na escola e acha que trabalho de professor é somente em sala de aula, mantendo os alunos quietos. [E depois querem resultados!…].

Na verdade, essas atividades ficam dentro das 4 horas restantes – a diferença entre as 16h que me pagam e as 12h que “dou aulas”.

Então, percebam: acham que o planejamento, preparação das aulas, preparação do docente para as aulas, estudo, pesquisa, conversa e entendimento com os outros colegas professores, preparação de provas e exercícios, correção das provas e exercícios, formação continuada, tudo, tudo, tudo que seja referente àquelas 12 aulas semanais devem ser feitas no tempo de… 4 aulas.

Dá uma média de 0,33 aula por cada aula. Se uma aula tem 45 minutos, por exemplo, eu recebo 15 minutos para fazer tudo referente a ela.

15 minutos por aula!

Todo mundo sabe que é impossível.

Todo mundo sabe que não dá tempo.

Todo mundo sabe que o professor tem que trabalhar muito mais do que lhe pagam para que possa realizar o seu trabalho. Para o realizar BEM, então, nem se fala.

Então, “pagá-lo pra quê, se mesmo sem pagar eles fazem?!?”

Esse é o pensamento das bestas que fazem as leis e as regras educacionais.

E, vejam, estou falando de uma das múltiplas realidades, da minha realidade,.

Peguem, por exemplo, o caso de uma professora do 1º segmento do ensino fundamental, que só tem o ensino médio (Normal) e tem que ensinar os alunos que nada têm fora da escola a ler, escrever, matemática, ciências, geografia, história…

Peguem essa professora que pode ser 20 horas (se trabalha em um turno) ou 40 horas (se trabalha os dois turnos) e que não tem nem os 15 minutos por aula que eu citei acima.

COMO ela vai preparar suas aulas, estudar, planejar, preparar exercícios, provas, fazer correções???

Têm-se os resultados que hoje colhemos.

Então, caros e caras amigas preocupadas com a educação de qualidade, deixemos de demagogia e façamos o que é certo:

  1. professor em tempo integral na escola (40 horas);
  2. METADE do tempo para estudo, planejamento, projetos, preparações, atendimentos a grupos menores, atendimentos personalizados, pesquisas, entendimentos interdisciplinares, etc.;
  3. Salário decente – compatível, por exemplo, com professores universitários, respeitando-se as formações e os tempos de cada um, ou seja:
  4. com um Plano de Carreira que a faça atraente.

O resto, como eu sempre falo, é remendo em roupa rota demais.

Até mesmo a nova lei – que, admitamos, será um avanço – que fixa em 1/3 o tempo de planejamento que tem que ser pago ao professor.

Abraços,

Declev Reynier Dib-Ferreira
13 anos de docência, com doutorado e na luta por uma educação de qualidade que respeite os professores

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No Diário do Professor você encontra artigos e links sobre o dia-a-dia da Educação:

Planos de aula, Atividades, Práticas, Projetos, Livros, Cursos, Maquetes, Meio Ambiente… e muito mais!

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Declev Dib-Ferreira

Declev Reynier Dib-Ferreira sou eu, professor, biólogo, educador ambiental, especialista em EA pela UERJ, mestre em Ciência Ambiental pela UFF, doutorando em Meio Ambiente pela UERJ. Atuo como professor na rede municipal de educação do Rio de Janeiro e também na Fundação Municipal de Educação de Niterói (FME), no Núcleo de Educação Ambiental (NEA). Sou coordenador de educação da OSCIP Instituto Baía de Guanabara (IBG) e membro/facilitador da Rede de Educação Ambiental do Rio de Janeiro (REARJ)... ufa! Fiz este blog para divulgar minhas idéias, e achei que seria um bom espaço para aqueles que quisessem fazer o mesmo, dentro das temáticas educação, educação ambiental e meio ambiente. Fiz outro blog, com textos literários (http://hebdomadario.com), no qual abro o mesmo espaço. Divirtam-se.

5 thoughts on “Professores da escola, ou “aulistas”? Reflexões…

  • 14/11/2011 em 20:46
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    Concordo plenamente com você professor Declev. Infelizmente vivemos num país em que a nossa profissão é sucateada e desvalorizada. Somos profissionais responsáveis, que tem direito a salários dignos, a ter uma carga horária que priorize tudo que de nós é cobrado/ mas que não dão espaço para que seja feito. Precisamos de uma política educacional que valorize o profissional da educação.

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  • 22/01/2012 em 20:52
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    “E onde fica o planejamento das aulas? Onde fica a preparação das aulas? (…) O estudo? A formação continuada?” Eu ainda acrescentaria; “E o tempo para preparação e correção das avaliações?”

    Afinal, uma boa avaliação deve ser bem pensada e é necessário um certo tempo para fazer uma correção que seja mais próxima possível do que seja justo para o aluno, que valorize os seus conhecimentos.

    Assisti uma reportagem sobre a correção de redações do Enem. Tal qual nas escolas públicas, os resultados são cobrados quando não são dadas as condições necessárias. Continuam dando murro em ponta de faca, e a educação das nossas crianças e jovens vai de mal a pior.

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    • 26/01/2012 em 03:14
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      Isso mesmo, Madge.

      Querem milagres pagando pouco por pouco tempo de trabalho ou uma miséria por muito tempo de trabalho.

      Mas acham que nosso trabalho é unicamente estar dentro de sala de aula. Por todo o resto, não nos pagam.

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  • 22/01/2012 em 21:40
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    SOU PROFESSORA DO ENSINO FUNDAMENTAL ,PEGUEI LICENÇA POR 02 ANOS,AO RETORNAR,02 COLEGAS MONTARAM UM PROJETO DE ARTES,40 HORAS,AS MESMAS SÃO CONCURSADAS EM 40 HRS,NO ENSINO FUNDAMENTAL,EXISTE UMA LEI QUE AMPARE TAL PROJETO?

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