Por que sempre precisaremos de um aterro sanitário?

Participo de uma lista de discussão sobre lixo – dentre tantas que participo – e sempre surgem uns assuntos polêmicos. É um tema que me interessa muito – o lixo – e que estudo há alguns anos. Hoje recebi uma mensagem em que o autor fala sobre a importância da coleta seletiva em detrimento de um aterro. Tenho um certo receio sobre a meneira que tratamos este tema, então o respondi com o texto abaixo. Inicio com este uma categoria sobre lixo. Então vamos lá, pois estamos todos imersos nesta montanha…

Acho que um aterro será sempre essencial. É muita ingenuidade achar que podemos reciclar todo o lixo – e isto traz graves consequências. Pra começar, a crença infinita na reciclagem e nas suas novas e competentes tecnologias nos leva, cada vez mais, para mais distante do que é realmente importante: a redução do desperdício, a mudança do modelo de industrialização, a mudança da matriz de produção, a diminuição da obsolescência planejada, enfim, da diminuição desta geração desesperada de lixo. Não adianta achar que podemos continuar neste bárbaro “desenvolvimento” e consumo só porque podemos “reciclar” e que com isto ainda vamos salvar as pobres almas carentes de tudo, fazendo a “inclusão social” através do lixo. Balela. Trabalhar a geração de renda de forma emergencial para aqueles que não têm nada? Ótimo. Mas fazer disso a solução de nossos problemas com o lixo? Trágico.

Trágico e imoral: nós consumimos, eles catam o resto de nosso consumo! Fazer disso uma solução para nossos problemas não irá mudar nunca a situação de extrema desigualdade que vivemos, muito pelo contrário, irá estagná-la ou aprofundá-la.

Vejam: só na cidade do Rio de Janeiro são mais de 5.400 toneladas de lixo domiciliar! Repito: mais de cinco mil e quatrocentas toneladas só de lixo domiciliar!! Fora todos os outros. E só na cidade do Rio de Janeiro. Veja aqui. Segundo Antonio, 95% do lixo poderia ser “reciclado”. Eu digo que é impossível. Em primeiro lugar, porque a coleta seletiva em uma cidade deste porte é extremamente cara. E não dá tanta renda assim como todos asseveram (não conheço nem uma cooperativa que viva do que cata, sem injeção de dinheiro externo).

Em segundo lugar, porque não teríamos nem capacidade industrial para tanto. A Alemanha, que tem um dos melhores esquemas de coleta seletiva do mundo, não tem condições de reciclar tudo o que coleta – “exporta” resíduos a outros países, muitas vezes de forma ilegal. E olha que cerca de 30 a 40% do material recolhido se transforma em rejeito e têm que ser dispostos em aterros. Lembrando ainda que, quanto maior o adensamento populacional e menor o nível cultural, maiores são as dificuldades para a coleta de lixo – quanto mais para uma coleta seletiva. Vocês conhecem áreas assim nas grandes cidades daqui? Então, mesmo que fizéssemos a coleta seletiva de todo este lixo, como todos querem, não teríamos o que fazer com ele! E mais: vale a lei de mercado, quanto maior a oferta, menor a procura, menor o preço e por aí vai. Teríamos um monte de gente catando, triando, prensando, transportando cada vez mais para ganhar cada vez menos e ficando cada vez mais miserável. Seria muito mais lógico e mais rentável ficar sentado numa esquina pedindo esmolas.

E em Niterói a Clin tem um trabalho de coleta seletiva sim. Basta o morador se cadastrar, seja casa seja prédio, que a Clin passa lá três vezes por semana para pegar o lixo separado. E ainda dá sacos transparentes. Só que, como eu falei, é caro. Como expandir para toda uma cidade uma coleta tão cara? Quem paga?

Sem esquecer de que pelo menos metade do nosso lixo é de restos orgânicos. Este não é reciclável no sentido que falamos aqui. Não é recebido pelos catadores, não vai para indústria. Necessitaria de toda uma estrutura para fazer-se a compostagem ou bidigestores. E mesmo assim, a tecnologia é complicada, visto que sempre vêm misturados com restos de plásticos, vidros, latas, metais advindos de lâmpadas, pilhas, etc., que comprometem o resultado. Ademais, o que fazer com milhões de quilos de composto?

Bom, ficando por aqui, quero dizer o seguinte:

1) na situação atual, é imprescindível um bom aterro sanitário – ou então teremos lixões em seu lugar;

2) a coleta seletiva não vai, nunca, solucionar a questão do lixo, especialmente se continuarmos a consumir, gastar, usar descartáveis, comprar, gastar, consumir, usar descartáveis, consumir, comprar, gastar, usar descartáveis… (e achar que está tudo bem, porque nossos restos são “recicláveis”).

3) temos que mudar nosso estilo de vida.

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Na mesma linha:

a) Minha dissertação;

b) Vê se isso não incentiva a produção do lixo!!!

c) Resíduos sólidos: a revisão dos conceitos

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Declev Dib-Ferreira

Declev Reynier Dib-Ferreira sou eu, professor, biólogo, educador ambiental, especialista em EA pela UERJ, mestre em Ciência Ambiental pela UFF, doutorando em Meio Ambiente pela UERJ. Atuo como professor na rede municipal de educação do Rio de Janeiro e também na Fundação Municipal de Educação de Niterói (FME), no Núcleo de Educação Ambiental (NEA). Sou coordenador de educação da OSCIP Instituto Baía de Guanabara (IBG) e membro/facilitador da Rede de Educação Ambiental do Rio de Janeiro (REARJ)... ufa! Fiz este blog para divulgar minhas idéias, e achei que seria um bom espaço para aqueles que quisessem fazer o mesmo, dentro das temáticas educação, educação ambiental e meio ambiente. Fiz outro blog, com textos literários (http://hebdomadario.com), no qual abro o mesmo espaço. Divirtam-se.

5 thoughts on “Por que sempre precisaremos de um aterro sanitário?

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  • 27/05/2008 em 22:39
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    Pertinente o texto acerca dos aterros sanitários, concordo plenamente que a reciclagem tão somente não é a solução para o mais grave dos problemas ambientais que enfrentamos na atualidade. No meu viver diário e na luta que travo para fazer chegar ao conhecimento de cada cidadão do “canto” onde moro acerca da prática dos “erres” que podem amenizar o problema do planeta. Quanto ao aterro sanitário, sabe-se que sua instalação está em alto custo e que não há interesse e “recursos” suficientes em município de pequeno porte para que seja efetivada sua instalação. Todavia não desisto, tenho um compromisso com a vida e continuaremos lutando para que possamos deixar aos nossos sucessores habitacionais do planeta, tempos propícios para vê a borboleta pousar em flores plantadas em jardins onde outrora foi lixo. Axé.

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  • 28/05/2008 em 23:40
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    É isso mesmo José Reis,

    Mesmo sendo caro, o início de toda a mudança, creio eu, é a instalação de um bom aterro.

    Mas paralelo, os trabalhos em relação à nossa sociedade de consumo: educação ambiental, diminuição do nosso consumo, diminuição do desperdício, aproveitamento das coisas, cuidado com as coisas, respeito e, por quê não?, a coleta seletiva e a reciclagem.

    É todo um conjunto de ações.

    Abraços.

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  • 15/01/2010 em 21:24
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    Parabenizar pelos comentários e dicas.
    Pergunto o que fazer com as embalagenstreta pak que vem marcando o novo e ‘lindo” consumo nacional? por que não há uma propaganda ou até mesmo um comentário sobre esta coleta?
    Concordo com a vertente de que otema reciclagem, coleta seletiva, três erres, são nada mais que tema da moda-modal. Reflete sim uma forma da consciência pesada dos tubarões das indústrias de varres do planeta(?), as sua lambanças.

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