Fazê-los pensar: tarefa inglória – Reflexões sobre uma aula e outras aulas

Fazê-los pensar: tarefa inglória – Reflexões sobre uma aula e outras aulas

Entro em sala e tenho os alunos sentados [muitos em pé], um quadro-branco à frente e um livro em minhas mãos.

Só.

Eles não trazem, normalmente, os livros. Se trazem, não são todos. Neste caso, nenhum.

Vejo-me em sala entre o quadro e os alunos, com um livro na mão e o total desinteresse dos discentes em saber qualquer coisa daquele livro, de fazer qualquer coisa que se refira a minha disciplina, qualquer atividade que venha propor, qualquer exercício, qualquer atividade que tenha que os fazer pensar.

Pensar?

Fazê-los refletir sobre determinado assunto – os batimentos cardíacos e a respiração, por exemplo, como estou tratando neste momento – é tarefa inglória.

Eu tento, faço perguntas, peço para medirem os batimentos, medirem a respiração, faço uma tabela, um gráfico, faço perguntas… eles conversam.

Conversam sobre os amigos, os namorados, a comida, sobre uns e outros, sobre o futebol… Ficam o tempo todo se xingando e sacaneando mutuamente.

O tempo vai passando e a aula não rende, porque não fazem o proposto, não escrevem sobre o exercício, não pensam sobre o ocorrido, não discutem sobre a prática, não pensam sobre as perguntas.

Com exceção de dois ou três, que tentam responder e fazer o proposto, o resto conversa.

Invariavelmente, pego o livro e faço um resumo de uma parte do texto no quadro, para que copiem.

Invariavelmente, eles sentam e começam a copiar, muitas vezes em silêncio, outras conversando.

Acabam as aulas, e tenho a certeza de que dois ou três aprenderam alguma coisa, muito menos do que deveria ou do que eu queria.

Os outros copiaram algo sem o menor sentido, outros ainda nem isso fazem.

A culpa deve ser minha.

Abraços,

Declev Reynier Dib-Ferreira
Sem ter pra quem dar aulas [aula de verdade]

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Declev Dib-Ferreira

Declev Reynier Dib-Ferreira sou eu, professor, biólogo, educador ambiental, especialista em EA pela UERJ, mestre em Ciência Ambiental pela UFF, doutorando em Meio Ambiente pela UERJ. Atuo como professor na rede municipal de educação do Rio de Janeiro e também na Fundação Municipal de Educação de Niterói (FME), no Núcleo de Educação Ambiental (NEA). Sou coordenador de educação da OSCIP Instituto Baía de Guanabara (IBG) e membro/facilitador da Rede de Educação Ambiental do Rio de Janeiro (REARJ)... ufa! Fiz este blog para divulgar minhas idéias, e achei que seria um bom espaço para aqueles que quisessem fazer o mesmo, dentro das temáticas educação, educação ambiental e meio ambiente. Fiz outro blog, com textos literários (http://hebdomadario.com), no qual abro o mesmo espaço. Divirtam-se.

5 thoughts on “Fazê-los pensar: tarefa inglória – Reflexões sobre uma aula e outras aulas

  • 06/10/2011 em 19:18
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    Eu já tinha mencionado isso no comentário a seu post anterior. E – certamente – não há de ser com um número maior de dias de aula que isso será resolvido.
    Por outro lado, é importante notar que, nem que tivéssemos uma estrutura de ensino comprável a um Japão ou uma Coreia do Sul, esse problema iria desaparecer.
    O que falta a esses jovens é motivação para a vida. Eles são, desde a mais tenra infância, treinados para consumir coisas de baixa qualidade, sob o demagógico rótulo de “popular”.
    Afinal, a sociedade sempre vai precisar de preenchedores de bilhetes de ônibus nas rodoviárias, vendedores ambulantes e “flanelinhas”… e para isso não é necessário saber de respiração e batimentos cardíacos.

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    • 06/10/2011 em 20:17
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      O que mais me aflige, João, é que tenho a certeza absoluta – e falo isso para eles, querendo acordá-los – que estou dando aulas, tirando as exceções que existem, aos futuros “limpadores de esgoto de casa de madame”.

      Infelizmente, talvez eles percebam tarde demais…

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  • 07/10/2011 em 00:05
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    Com o risco de parecer apocalíptico ou catastrófico: acho que,no futuro,eles JAMAIS perceberão que se tornaram limpadores de esgoto de casa de madame.

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  • 09/10/2011 em 20:44
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    Se esses alunos (nossos ),já que não é só vc que tem esse tipo de aluno vão desempenhar um trabalho hoje muito desvalorizado no futuro não me parece ser o maior problema. A questão que me deixa tenso é a postura que eles vão ter na relação com outros humanos.
    Luiz Costa

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