Reflexões sobre os problemas da escola brasileira e a busca de soluções

 

Bom gentes, todos conhecem a escola em que trabalho, certo? (Mas quem não conhece e quiser saber, veja, por exemplo, este artigo, mais este e este outro).

Pois é. Posso listar uma série de fatos que a fazem o que é – e sei que muitas e muitas são o que são por motivos parecidos:

a) localizada dentro de um bairro perigoso, acuado pelo tráfico e sem a infraestrutura de lazer ou urbanização dos bairros de classe média;

b) com salas de aula lotadas (30, 35 ou 40 alunos);

c) com alunos sem base familiar que possa ajudar, de alguma forma, na sua educação escolar;

d) com falta de professores;

e) sem equipe técnico-pedagógica, contando apenas com uma coordenadora – hoje, porque ficamos dois anos sem;

f) com salas de aula barulhentas e quentes – sem ar-condicionado, com ventiladores barulhentos, dando de frente para uma rua com intenso fluxo de caminhões;

g) com falta de inspetores para dar conta dos corredores –  o que tem não dá;

h) com intensa movimentação de alunos nos corredores;

i) que sofre com depredações diversas de portas, ventiladores, banheiros, etc.;

j) pela qual a maioria dos alunos não consegue aprender o mínimo – ler e escrever decentemente;


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l) onde os alunos adoram ir, mas detestam assistir aulas;

m) onde há ótimos professores, mas também os problemáticos, que não ajudam na melhora – por má vontade ou mesmo por incapacidade;

n) onde os professores não têm tempo livre e pouco se encontram para programarem e planejarem sua prática conjunta;

o) na qual a relação diretoria corpo docente não seria a melhor do mundo.

E por aí vai. Poderíamos chegar a “z(n)”.

Mas eu sou inquieto.

Sou teimoso que nem mula empacada.

E gostaria de desempacar esta educação capenga.

 

Além de tudo o que sofro fazer, como já mostrei aqui (veja exemplo e exemplo), começo a tentar um movimento de mudança; mais por minha própria sobrevivência, confesso o egocentrismo, pois realmente não aguentava mais [não] dar aulas naquele inferno.

Uma das coisas que tenho feito, podem me criticar à vontade, é dividir a turma e dar duas aulas diferentes.

Um grupo deixo trabalhando na sala de ciências com uma proposta de pesquisa e trabalho em grupo. Deixo-os lá e vou de vez em quando retirar dúvidas e ver o andamento das pesquisas.

Lá este grupo tem à disposiçao livros, revistas, aquários, materiais de artes (lápis de cor, hidrocor, réguas, cola, cartolinas, etc.), etc.; ou seja, tudo o que tem na sala.

É claro que eu deixo lá aqueles que eu sei – ou que eu acho – que posso confiar. Aqueles que se eu deixar fazendo uma pesquisa, com toda a dificuldade que têm, vão fazer.

E na sala mais esvaziada fico com os outros, trabalhando com o livro didático. Passo exercícios, cópias no quadro, leio o livro com eles, respondo os exercícios junto, etc.

Está funcionando! Eureca! Com dois lugares com menos alunos, consigo dar aulas!

E não me venham com o pedagogês de “mas você está fazendo uma separação dos bons e dos ruins”, “você pode traumatizar as crianças” e blá blá blá! TRaumatizado estava eu!

SIM! Estou separando! E fazendo isso, consigo desenvolver trabalhos específicos para cada grupo! Consigo ver quem tem dificuldades nisso ou naquilo. Consigo separar os “grupinhos”. Consigo fazer com que, aqueles que atendem à proposta, busquem o conhecimento através de pesquisas em grupos.

Ou seja, consigo.

E tenho menos trabalho do que trabalhando com todos juntos.

Mas não paro por aí hein! Tem mais coisas acontecendo por lá!

Estou em conversas com um grupo de professores e com a coordenadora – parceira – para o desenvolvimento de trabalhos diferenciados não só por mim e nem só com a simples separação da turma em duas.

Mas esta é uma história para um próximo artigo.

Esperem e verão.

13 comentários em “Reflexões sobre os problemas da escola brasileira e a busca de soluções”

  1. Declev, quem será a besta quadrada que espalhou essa falsa noção de que é obrigatório tratar de maneira igual pessoas com capacidades e necessidades diferentes?

    Este falso “igualitarismo” é de uma estupidez sem par! Até o famoso “Manifesto Comunista” propunha: “de cada um, conforme suas possibilidades; a cada um, conforme suas necessidades”.

    Só faltam inventar “banheiros unissex” (que seria uma baita economia na construção) em nome desse “igualitarismo” de folhetim…

    “Diferenciar” é uma coisa. “Discriminar” é outra. Se você abandonasse aqueles que precisam da presença constante do professor e se dedicasse a ensinar apenas aqueles que aprendem com mais facilidade, aí, sim, você estaria se furtando a seus deveres de professor.

    Mas você está fazendo exatamente o contrário! Mais atenção a quem precisa dela e mais liberdade a quem sabe usá-la.

    Mas uma pergunta se faz essencial: algum aluno está se queixando?

  2. Olá João,

    É isso; difícil trabalhar com uma só proposta quando se tem 35 pessoas diferentes numa mesma sala.

    Sim, tem alunos se queixando. O fato é que todos querem ir à sala de ciências. Quando os separo, claro que há reclamações, visto que um grupo fica desenvolvendo trabalhos com recortes, pesquisas, desenhos; outro, com o livro, na sala de aula ‘comum’.

    As salas de aula ‘comuns’ das escolas me dão arrepio. Me sinto preso e limitado nela. Por isso as tentativas de trabalho com a sala de ciências.

    Só que com 35 alunos, fica praticamente impossível de desenvolver um trabalho decente com todos, se não houver interesse e participação deles.

    Enquanto tem alguns pesquisando, lendo, recortando, perguntando, desenhando, montando um painel ou seja lá o que for, outros ficam sem fazer nada, atrapalhando os colegas, jogando bolinhas de papel, implicando, rabiscando os livros, rabiscando as mesas…

    Que queu fiz? Coloquei na sala este grupo, deixei na sala de ciências aquele.

    Claro que o que fica na sala se queixa. Mas aí eu digo que quando eu tentei fazer algo com eles lá, não tive condições. E a toda hora tenho que chamar atenção deles, mesmo com a sala com poucos alunos.

    O que eu estou fazendo – como teste, pois comecei a umas duas semanas – é verificar aqueles que reclamam e que acham “injusta’ a separação; se percebo que haverá condições dele se juntar ao grupo e ser produtivo, o faço.

    Tem dado certo.

    E as queixas, na realidade, dão margens a conversas sobre a escola, o futuro deles, a forma de trabalho entre professor e alunos, etc.

    Sempre digo a eles que ‘cópia não é aula’. O professor retirar do livro, colocar no quadro, o aluno retirar do quadro e colocar no caderno [o que acontece em muitos casos…] não é aula, é enganação.

    Por isso sempre enfatizo a importância do estudo por parte deles mesmos, da pesquisa, da busca, das perguntas, etc.

    Vamos ver se ao menos isso eu consigo ‘ensinar’.

  3. Bom!… Na hora em que os “recalcitrantes” conseguirem entender a diferença entre “aprender brincando” e “fazer bagunça”, você terá salvo umas 1000 almas do purgatório…

    Eu, sem conhecer seus alunos, vou apostar que os “difíceis” são crianças com problemas de relacionamento com autoridades (pais, irmãos mais velhos – familiares em geral) e que, no geral, apresentam baixo rendimento no aprendizado.

    Se você dispusesse dos meios, é até provável que conseguisse encontrar um ou outro super-dotado entre eles (inteligente o suficiente para não aceitar uma “autoridade” apenas etária, mas sem o discernimento para perceber que nem todos os “mais velhos” querem “apenas mandar neles”).

    Outra perguntinha indiscreta: e o que os outros professores estão comentando?…

  4. Estou tentando salvá-las, João. Quero justamente iso: que aprendam. Cada um do seu jeito.

    E, sim, são crianças com este perfil, na maioria dos casos.

    Há crianças muito inteligentes, e há aqueles com grande dificuldade de aprendizado.

    Sinceramente, não sei se os professores estão preparados para a grande diversidade que existe em uma sala.

    E meus colegas? Se não gostam não me falam. Como eu disse, estou tentando organizar, junto com a coordenadora, um trabalho com oficinas, aulas práticas, etc., envolvendo mais gentes.

    Tivemos uma reunião e ninguém foi diretamente contra; eles só são sabem como colocar em prática.

    É isso que eu quero agora: ajudá-los a a colocar em prática.

    Será, com certeza, motivo para alguns artigos.

    Abraços.

  5. (Continuando a troca de idéias)

    Você empregou uma construção que me deixou “esquerdo”: «Há crianças muito inteligentes, e há aqueles com grande dificuldade de aprendizado.» Eu imagino que por “com grandes dificuldades” você esteja enquadrando aqueles cujo desenvolvimento mental já foi seriamente prejudicado pelas condições em que cresceram. Eu conheço um exemplo extremo disto. A mulher de um colega meu de Marinha é professora do fundamental. O casal chegou ao ponto de adotar um dos “alunos problema” dela (e sem empecilhos: a “família” ficou muito feliz em se livrar de um problema…)

    Quanto ao preparo dos professores, eu nem tenho sua dúvida: certamente, não estão. Não só por uma questão de formação deficiente (nem todos têm este problema), mas também pela própria falta de condições dos professores em se dedicarem a um relacionamento mais próximo com seus alunos (turmas grandes demais, trabalho em mais de um turno e, normalmente, em mais de um colégio) e – last, but not least – a total falta de apoio das direções e escalões superiores.

    Finalmente, se nenhum de seus colegas se opôs diretamente à idéia, alvíssaras!… Realmente não é algo fácil de colocar em prática em matérias “mais tradicionais”, tais como português e matemática… (Neste ponto, eu sou mais radical: eu penso que todo o currículo e a forma de apresentá-lo e – como direi?… – transmitir o conhecimento, têm que ser profundamente repensados).

    Aguardo ansioso pelos desdobramentos futuros dessa iniciativa!…

    Um abraço e votos de pleno sucesso!

  6. Pode deixar que mandarei notícas sobre este caso.

    E sim, os alunos com maiores dificuldades de aprendizado certamente são aqueles que não tiveram, desde sempre, o apoio necessário.

    Sempre há as exceções, mas as regras são sempre estas. O apoio familiar (no estudo, na construção cultural do aluno) é extremamente importante.

    Mas a questão vai muito além disso. Muitas vezes, o desenvolvimento ‘mental’ dele não foi tão seriamente prejudicado, mas ele simplesmente não sabe o que é estudar, o que é aprender e o prazer que isso dá.

    É uma questão de cultura. Estudar pra quê? Como? Por quê? Com o quê?

  7. Muitas vezes, o desenvolvimento ‘mental’ dele não foi tão seriamente prejudicado, mas ele simplesmente não sabe o que é estudar, o que é aprender e o prazer que isso dá.

    É… Percebi que não fui feliz na colocação… Eu não estava me referindo especificamente (embora possa incluir) aos que apresentam “deficiências mentais” (eu não sei mais os termos “politicamente corretos” para me referir a coisas com “retardamento mental”).

    Talvez fosse mais claro sob a abordagem das “inteligências múltiplas”. Em suma, eu estou falando de crianças cujo ambiente familiar não valoriza a aquisição de conhecimentos. Ou, colocado com bastante clareza: o exemplo!

    Eu acredito que já mencionei uma pesquisa de uma univesidade americana sobre os efeitos de um Programa de Assistência às Famílias da Prefeitura de Chicago (se não o fiz, faço agora). O acompanhamento do programa, ao longo de dez anos, mostrou em números frios que as crianças oriundas de famílias problemáticas (ou potencialmente problemáticas) que tiveram apoio desde a época de pré-escola (e eu nunca me canso de repetir como a pré-escola pública é importante), apresentavam menores índices de evasão escolar, melhores índices de aproveitamento escolar e índices significativamente menores de incidência na criminalidade. O estudo concluia que, para cada dólar gasto neste programa, se economizava três dólares, mais tarde, em cadeias, gastos com polícia e com processos legais.

    Eu acredito que essa é uma tecla sobre a qual os nossos educadores deveriam bater com mais força e freqüência: investir em educação poupa dinheiro de impostos em combater a marginalidade e o crime!

    E já que ninguém parece disposto a atacar o problema motivado pela solidariedade, que tal argumentar com o “bolso”? “Gaste mais com educação e evite a construção de um presídio perto de sua casa!”

    Este é o tipo de argumento que qualquer idiota entende…

  8. Pois é João… acho que falamos a mesma coisa…

    E este argumento financeiro deveria ser para tudo.

    Sabe-se muito bem, por exemplo, que o investimento em saneamento básico reflete em muito mais na economia em saúde.

    Chegaremos lá, mas quanto tempo perderemos? E falo de tempo relativo: são gerações que se perdem…

  9. Pingback: Projeto de educação para uma escola diferente - como fazer algo diferente? | Diário do Professor

  10. Olá Declev Dib-Ferreira, eu estava pesquisando sobre problemas nas escolas pois pretendo iniciar um projeto e lí o seu comentario… cara eu sei que é dificil mas não desista, fique firmes, sei que são poucos iguais a vc que querem realmente mudar a condição de vida dos nossos alunos. Deus te abençoe.

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