Educação como projeto profissional: frustração, alegria, raiva, superação, insatisfação, contentamento… Sei lá, mil coisas

 

Aí você fala, fala, fala…

Ensina, ensina, ensina…

Se desgasta, briga, luta, corrige…

Você quer que as pessoas percebam o que [você acha] que seja melhor pra eles (e para coletividade), então conversa, dialoga, discute.

Ouve (as ideias podem ser diferentes das suas) e debate. Troca ideias. Reflete sobre elas e pode até mesmo mudar um pouco, admitindo outras.

Então, com essas outras, você fala, ensina, briga, discute, troca…

Você lê, aprende, quer ajudar outros a fazer o mesmo…

Quer melhorar o ambiente da escola, desenvolvendo ideias, projetos, bons relacionamentos…

Mas a percepção que temos às vezes é que nossa ação é inócua.

Apesar de saber [ou achar, ou querer acreditar] que não, a sensação que dá é de remédio sem efeito.

Um placebo.

Professor, profissão placebo.


PRECISA DE UMA RENDA EXTRA??

Com o app abaixo, você ganha Cashback em cada compra sua e ganha 50 REAIS a cada indicação!


 

Ora, já fiz a comparação com outras profissões, inclusive com a de médico.

Então… e a receita do professor, é seguida?

E o estudo, o debate, o conhecimento, a escrita, a leitura, os trabalhos, as anotações?

E o acompanhamento aos filhos, a ajuda, o olhar o caderno, cobrar os deveres, visita às escolas?

Pela experiência acumulada, talvez poucos façam. Pouco, também, o resultado visível e imediato do nosso trabalho docente… vide os resultados que colhemos em testes e avaliações por aí, independente das críticas que se podem fazer a essa forma de avaliar a educação – críticas que as tenho muitas.

Certo dia chego à escola de Niterói e uma decepção profunda me atormentou, por vários motivos.

 

Depois de praticamente toda a área livre da escola ter sido cimentada, sobrando praticamente nenhuma área de terra (onde antes havia muita), duas frondosas árvores (jameloeiros, cada vez tão mais difíceis de encontrar…) foram duramente podadas quase ao nível de seus troncos principais, abrindo uma clareira enorme onde antes havia uma grande copa e sombra.

Ao mesmo tempo, a escola participou – com minha participação voluntária na esquizofrenia – do “dia internacional de plantio de árvores”, enviando um cadastro e solicitação de mudas para plantio… em vasos.

Plantamos umas, morreram outras antes de serem transplantadas.

Ao mesmo tempo, tenho que ensinar química, átomos, prótons, nêutrons, elétrons, camadas, tabela periódica… a uma turma que sequer sabe decifrar um texto simples!

Penso como, pra quê, por quê e em que será isso útil a eles (e a mim).

Depois, em conversas com colegas, vou me inteirando de todas (isso mesmo todaS) as meninas que estão engravidando na escola… até agora, temos 5 adolescentes grávidas!

Uma delas dei aulas ano passado e durante todo ano conversamos sobre gravidez, sobre tomar cuidado, sobre suas atitudes etc. Me garantiu que “não, professor, tá tranquilo, não vai acontecer não, para com isso, deixa disso…”

E ao mesmo tempo, outros fatos vão-nos dando força. São os “mas”…

Mas, na verdade, disse-me a diretora que os trabalhadores afirmaram que as árvores foram podadas (bastante, para o meu gosto) de forma que elas crescerão novamente e até mais fortes.

Mas, em conversa com a pedagoga da escola sobre minha frustração com as barrigudinhas, disse-me ela que “imagina quantas mais não teriam se não trabalhássemos este tema com elas…”. É, pode ser.

Mas, conversando com outra colega, esta me diz que no Conselho de Classe (no qual não participei pois não era das minhas turmas), falou-se que “muitas turmas ali, hoje, sabem trabalhar em grupo porque o professor Declev sempre trabalhou com eles assim”.

Confesso que quase chorei de emoção.

Abraços,

Declev Reynier Dib-Ferreira
Em crise intermitente

2 comentários em “Educação como projeto profissional: frustração, alegria, raiva, superação, insatisfação, contentamento… Sei lá, mil coisas”

  1. Acho todo essa sua, como dizer, dicotomia mental (gostei dessa!rs)essa ebulição psiquica, vamos dizer assim, faz parte da nossa rotina como educador. Ver que o nosso trabalho é de ‘formiguinha’ com resultados lentos, poucos, entretanto NUNCA nulos. Isso é muuuuito legal!
    Só ressalto algo que, certamente você como um educador experiente, esta cansado de saber e acho que vale a pena ressaltar: vc colocou que o dia a dia da escola trazem temas muitos mais relevantes que átomos, tabelas periódicas etc. Temas como gravidez na adolescência, plantio e replantio de árvores, como fazer uma horta e etc tem muito mais a ver com a rotina das crianças e provavelmente gerariam muito mais aprendizado e motivação ao seu público. Então, porque não trabalhar esses temas única e exclusivamente? Enfrentei essa guerra na minha escola e foi muito difícil. Fizemos uma mudança curricular onde não teremos os ditos “conteúdos convencionais” com os alunos do 6º e 7º anos já que são normalmente alunos semi-alfabetizados e precisam ser massacrados com leituras, interpretação e produção de textos. Foi uma guerra com os próprios colegas que, presos ao currículo mínimo esquecem que ele não é obrigatória. O nome já nos dá a deixa: DIRETRIZES pedagógicas e não REGRAS. Que tal mudar, atualizar, reorganizar o currículo para atender a necessidades mais específicas da realidade de vocês ao invés de obedecer a uma DIRETRIZ tratando como REGRA, quando não o é. Convencer os colegas de área a tal mudança é complicado. Uma verdadadeira batalha. Mas com argumentos lógicos e fortes como os que você utiliza aqui, é possível. Já tentou esse caminho, Declev? Aproveitando a oportunidade, obrigada por seus artigos expressivos SEMPRE!!!

    1. Oi Priscila,

      Eu que agradeço seu comentário.

      Sim, esse currículo mínimo nos fecha numa jaula… que é difícil de sair.

      Eu faço deste mínimo realmente o mínimo e, sempre que posso, trabalho outros assuntos com eles, mais relevantes.

      Mas acabo me sentindo culpado se não abordar nada da “matéria” tradicional, por alguns motivos.

      Em geral, alguns poucos continuam seus estudos, não param no 9º ano (caso deste caso citado).

      Ao menos não dar este mínimo os fará, ao meu ver, entrar no ensino médio com uma defasagem ainda maior.

      Ficamos engessados a isso. Foi sobre o que o artigo que trago em meu artigo anterior fala:

      http://diariodoprofessor.com/2011/06/28/competicao-vestibular-indices-de-avaliacao-provas-sao-ferramentas-boas-para-a-educacao/

      Como sair desta bifurcação?

      Largar tudo e que se dane o que vem depois (com a possível continuidade dos estudos, enem, vestibular, etc.)?

      Trabalhar apenas com isso?

      Bom, eu tento um caminho alternativo, do “meio”.

      E vamos levando…

      Abraços,

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima