Escola, professores, alunos, educação… era um projeto de resposta, virou um artigo…

 

Bom, cares amigues… 

Após o comentário do Poeta Luiz, que generosamente recebi no artigo Mais um dia na vida de um professor (comentário n. 6), fui respondê-lo.

Como é de costume… me empolguei.

Aí achei que poderia virar um outro artigo e, tcham tcham tcham tcham… aqui está.

Divirtam-se…

 

Prezado Luiz,

Bonitas palavras.

Mas vá ser professor.

É muito fácil falar. Escrever mais ainda.

Mas trabalhar “fomento a leitura, incentivo a poesia, cultura local, cordel, manifestações artísticas e culturais” em uma escola, por exemplo, como a que trabalho, é extremamente difícil.

Altamente barulhenta; intenso tráfego de caminhões em frente; corredores sempre lotados e barulhentos; poucas pessoas para ajudar aos professores, que se vêem sozinhos em sala; falta de tempo suficiente para fazer estes trabalhos; calor infernal quando tempo quente…


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E também é muito fácil, para nós, classe média, focar a “cooresponsabilidade entre o aprimoramento intectual e o acesso ao mercado de trabalho futuro”, mundinho no qual isso funciona.

Mas muito difícil desenvolver este pensamento em alunos os quais vivem em locais dominados pelo tráfico, em que sua opção de mercado de trabalho é a violência, que não têm direito de ir e vir e que suas manifestações culturais quase unicamente se dão através de baile funk.

Muito difícil fazer, por exemplo, minha aluna que é proibida de ir à Praia de Ramos porque lá é outra facção criminosa que domina, entender que existe uma “linha pensamental na busca de conhecimentos técnicos didáticos, ou não, somados a uma socialização para o convivio na interação social”.

“Convívio na interação social”? Ãhn??

Muito difícil fazer com que meus alunos – que vivem em um local afastado de todas as “manifestações artísticas e culturais” tais como museus, cinemas, entre outros – e onde tudo o que têm acesso como manifestação cultural é, repito, o baile funk, vejam outra coisa além disso.

Ou você acha que eles, pobres, pardos, negros, favelados – ou seja lá qual adjetivo que nossa classe média sem noção queira dá-los -, têm acesso a toda a “cultura” da cidade?

Mesmo de graça, Luiz, há uma barreira invisível que os repele.

E, assim mesmo, há barreiras físicas e espaciais.

Verba para ônibus? Não temos.

Pegar ônibus de carreira? Proibido pela Secretaria de Educação e, mesmo assim, impossível fazê-lo com uma turma inteira e os microônibus com uma entrada e roleta colada na porta que os servem. E igualmente impossível fazer isso pegando dois ou três ônibus, o que muitos dos lugares requerem.

Já quase saí na porrada com motorista e fiscal por causa disso, se você quer saber.

Mesmo assim, apesar de tudo, realizo muitas atividades diferenciadas com a intenção de ajudá-los a ver a vida de modo diferente. Coloco música em sala (não funk, apesar das reclamações), trabalho com arte, já produzi peças teatrais, desenvolvi projetos, saídas em campo, poesias, redações etc.

 

Procure em meus outros artigos e veja as produções. 

Portanto, Luiz, eu tenho todo o direito de reprovar “a atitude generalizada dos alunos”. 

Mas você nem ninguém têm o direito de dizer que ao fazê-lo “é porque não estamos mais aptos a exercer a função de educador ou professor”. 

Tenho todo o direito porque quem está para fazer algo por eles sou eu. 

Se você quer saber nem mesmo muitos pais e mães estão. 

Mas com certeza não está quem critica minha crítica. 

Não está a secretária de educação. 

Não está o governador. 

Não está o presidente da república.

Mas todos querem uma educação de qualidade e ela recai somente sobre os professores.

Sabe por quê? Porque sabe quem está lá?

Estou “nós”, professor.

“Nós” que preparamos nossa aula e levamos chiclete no cabelo (fatos já ocorridos comigo…). 

“Nós” que pensamos em algo diferente para eles e não conseguimos fazer que façam. 

“Nós” que oferecemos a eles uma aula com arte e os vemos fazendo guerra de tintas ou de argila, rabiscando paredes e carteiras. 

“Nós” que chegamos para dar aulas e somos recebidos com um “ah, professor, por que que você veio?”. 

“Nós” que chamamos a atenção de quem está fazendo bagunça atrapalhando os colegas e somos ignorados ou agredidos verbalmente. 

“Nós” que enfeitamos a sala e os corredores em um dia e os vemos todos sujos, rasgados, mulambentos no outro. 

“Nós” que levamos filmes para passar e sofremos para conseguir uma Tv com DVD que funcione e, quando conseguimos, temos que parar inúmeras vezes para solicitar silêncio e atenção. 

“Nós” que estamos lá. 

“Lá” não estão os que criticam, a secretária de educação, o governador, o presidente da república, os responsáveis… 

“Lá” estamos nós, o professor. 

E, lembre-se, que ao apontar àqueles que “quando reprovam a atitude generalizada dos alunos é porque não estão mais aptos a exercer a função de educador ou professor”, você está com “um dedo apontado para eles e cinco para você”. 

Não tenho mais, como achava, o dom da certeza absoluta; então, talvez você tenha razão: não estamos aptos a exercer a função de educador ou professor, pois as condições que nos dão não nos deixam sê-lo…

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Na mesma linha:

Despreparo do jovem brasileiro

11 comentários em “Escola, professores, alunos, educação… era um projeto de resposta, virou um artigo…”

  1. (Eu acho que já disse isto antes… de qualquer forma, é bem a propósito)

    Me lembrei de um Comodoro americano, Comandante da Guarda-Costeira (que, apesar de não ser do Departamento da Defesa, faz parte do orçamento militar) defendendo seu pedido de verbas para o orçamento do exercício seguinte:

    “Vocês [o Congresso] já se acostumaram tanto a nos ver fazendo muito, com pouco, que vão acabar querendo que façamos tudo, com nada”…

    O mais curioso é constatar que os três “Serviços Públicos” mais básicos e essenciais: Segurança, Saúde e Ensino, são os que menos recebem meios e têm as remunerações mais ridículas. Mas, na hora em que “falham”…

    P.S: aí, quando acontecem as “Eloás” da vida, todos querem apontar “dedos acusadores”… Os mais “intelectualóides” sempre aparecem para “socializar as culpas”: “… isso é um reflexo de nossa sociedade…” Alto lá!… Eu faço parte “dessa sociedade” e, se dependesse de mim, nada disso estaria acontecendo!

  2. Perfeito João!

    Dão cadeiras, quadro e giz para o professor, os fazem trabalhar em 3 ou 4 empregos e querem que eles salvem a humanidade da barbárie…

    E há um movimento, hoje, na educação ambiental brasileira, no qual eu me insiro, que está atento a essas “generalizações”.

    “A culpa do meio ambiente estar assim é do Homem…”

    Alto lá!… Sou Homem (Ser Humano) e não tenho a mesma responsabilidade do Bush (que, a princípio, é um ser humano…)!

    Abraços.

  3. Pequeno adendo: muitas pessoas se esquecem do “princípio de auto-inclusão” quando disparam um “ninguém fez nada!…” (“ninguém”, inclusive quem está falando…). Pior ainda é quando sai um “todo o mundo se engana…” (ué!… e quem está falando não faz parte do mundo?…)

    Ah!… Sim!… Olha só… Eu tentei apontar um dedo acusador para qualquer coisa e, mesmo dobrando muito o polegar para trás, o máximo que eu consegui foi apontar quatro dedos para mim… 😉

  4. Tudo que você escreveu é uma realidade, realidade plena, realidade imutável enquanto dure, só que não dá para lecionar para o vazio, o público é, foi e será sempre o aluno, o aluno que, em aprender, aliás penso que vem aprender, buscar o conhecimento, porém o repasse deve ser feito, – mas somente o repasse em si?, penso que não, primeiro deve-se humanizar o aluno, o público que será norteado para este fim, “Educar é provocar transformação” como tranformar o ambiente social se estamos encolerizados, raivosos, irritadiços, Não. Se existe um barulho infernal, se existe um núcleo gestor que apenas gerencia o poder burocrático do estado, fica dificil.
    É uma questão complicada, pois é uma questão de prioridade, penso que a prioridade da escola é educar e fornecer conhecimentos ao alunado, do contrário, pode ser tudo menos uma escola.
    A escola que o Brasil Precisa é a escola que veja o aluno como aluno, ou seja uma pessoa carente de conhecimentos, carente emotivamente, carente de ações positivas, carente de poder ser o que nunca foi, enfim, tendo esta largueza de espírito que se está diante de uma pessoa fragilizada e que precisa ser cuidada em todos os aspectos sem o dogmatismo ou piedade, ou lutar heroicamente, sem o pensar em ser recompensado, sem brilho, sem vaidade… com o único pensar. Que penasr é este ? Em um futuro melhor para todos os componentes da socieade.
    Quem ganha com isso? as futuras gerações, pois tiramos das costas um peso que com certeza não iria suportar.
    Quem tirou este peso ?
    Nós ?
    Que nós é este ?
    Todos que pensam em uma educação de qualidade e universalizada para todos que se habilitam a uma profissão muito difícil nos dias de hoje.
    Que profissão é esta ?
    Ser um bom aluno.

  5. Caro Luiz Domingos de Luna:

    Não posso concordar com você… A “escola” que você está sugerindo tem mais as características de um orfanato. Se você está se referindo a todo um programa para assistir, não só as crianças (enquanto alunos) mas, também, suas famílias (o que inclui, mas não só, programas de assistência médica, de qualificação profissional, de encaminhamento para empregos a até as “esmolas públicas” do tipo “Bolsa Família), eu começo a concordar…

    Mas as escolas, atualmente, nem conseguem ser meras escolas! (Naquele sentido tradicional: um lugar onde se vai para ter aulas, passar nas provas e sair tão ignorante quanto se entrou, com um papelucho que pode ou não se mostrar útil…) Nem isso!

    Quando e se essa “função social mínima” de “disponibilizar conhecimentos” puder ser efetivamente cumprida, teremos dado o pequeno primeiro passo para uma longa jornada.

    Acredito (como creio que a maioria acredite) que essa jornada não só é necessária, como imprescindível. Mas – como toda jornada longa – ela começa com o primeiro passo… Por enquanto, todos os passos que se tem dado nessa direção, tem tido o sentido oposto ao que se quer: só temos andado para trás!

    Construir um prédio, arrebanhar um bom número de crianças e outro tanto de professores, e colocá-los neste prédio não criam uma escola. Mas mesmo essas providências simplistas são muito difíceis de tomar, neste jogo de politicagens baratas, onde a boa idéia alheia tem que ser sabotada…

  6. Sou professora ha 37 anos.
    Hoje moro no Rio e dou aulas para crianças com pequenos problemas.
    Tambem me sinto desrespeitada , frustada, revoltada e concordo que as vezes andamos para trás.
    Sou solidaria a todos voces e ainda sonho ter um dia, ensino de qualidade como desejamos ter.
    Abraço a todos

  7. Oi Heloisa,

    Me sinto assim todo dia que não consigo as coisas como acho que deveria conseguir…

    Em compensação, quando fazemos um bom trabalho e temos uma boa resposta, compensa, né?

    Abraços.

  8. Cara, você es~´a dizendo tudo que a maioria de nós , professores, queria dizer. As vezes penso que estou ficando louca! que nao é possível o que vejo! Que é mentira… que os alunos nao tem preguica mental! talvez eu que nao saiba dar aula. Mas quando pego a REVISTINHA do Estado de Sao Paulo…é agora temos que seguir rigorosamente uma revistinha, com um rap que fala de se pular roleta do ônibus e roubar alimento nos mercados é solucao para o o javem que vai a praia e nao tem dinheiro para comprar comida, que faz apologia ao uso de drogas, eu vejo que nao estou louca nao. Eu estou PROFESSORA! Parabéns ! Precisamos nos unir e ao menos gritar para que saibam que nao concordamos com com esse sistema.Abraco
    Luciana

  9. Oi Declev,

    Eu adoro o jeito que você escreve, direto, sem mt frescura, aproveitando a liberdade de se expressar como bem quiser nesse mundo virtual.
    São mt legais as discussões que vc promove e que te inspiram a criar novos artigos.
    Qnd eu crescer quero ser igual a vc… rs
    Teu site virou um vício sabia?
    bjs

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